1 de dezembro de 2009

Ponto de Citação - Radiografia (I)

"(...) Aquilo que transmite informação faz homens e mulheres livres. E uma das lacunas de Portugal - por falta de hábito, de experiência, de cultura - é não ter cidadãos livres, informados, capazes de participarem de modo independente na vida pública.

(...)

Mas houve mudanças e aberturas...
Sim, décadas de abertura com a emigração, a televisão, o turismo e, depois do 25 de Abril, as liberdades, as viagens, a integração europeia, a adesão, a liberdade do comércio. Os portugueses ficaram a conhecer o que há de melhor no mundo e portanto a ambicionar o que há de melhor no mundo. As pessoas querem ter o sistema médico sueco, o escolar dos noruegueses, as estradas dos alemães, os automóveis dos ingleses. Ambicionar uma coisa medíocre é em si mesmo um sinal de mediocridade. Os portugueses querem o máximo, simplesmente não são capazes de fazer o máximo, simplesmente não são capazes de fazer o máximo: não têm organização, nem capital, nem empresas, nem experiência, nem treino.

E porquê, justamente?
Porque já estamos atrasados há 250 anos, porque perdemos 15 ou 20 anos com a guerra colonial, com uma ditadura que durou, durou, com uma Revolução que fez disparates, disparates. Tivemos de revolucionar e fazer a contra-revolução, nacionalizámos e privatizámos. Foi uma perda de tempo, de recursos, de energia e abriu feridas. Ainda hoje noto que Portugal tem uma maneira de fazer política mais crispada que muitos países da Europa. O primeiro-ministro, o chefe da oposição, os partidos da oposição falam uns com os outros no Parlamento aos gritos, evocando problemas de honra, evocando a mentira, a coragem, a vigarice. Nos debates parlamentares de Madrid, de Paris, dos Estados Unidos, ou até de Itália vemos que as pessoas são capazes de falar racionalmente, com bons modos e educação, sem que lhes falte energia ou têmpera. Mas nunca com esta crispação portuguesa, que vem mantendo ao longo dos últimos 20 ou 30 anos. No fundo, o facto de os portugueses serem os mais pobres dos mais ricos cria uma terrível frustração... Fazendo parte dos ricos - parece paradoxal mas é verdade, há 150 países mais pobres que nós -, somos o último deles, e isso aumenta-nos a frustração. A distância entre o que temos e o que gostaríamos de ter é muito maior que noutros casos."

Excerto da entrevista de António Barreto, Sociólogo e Presidente do concelho de administração da Fundação Francisco Manuel dos Santos, ao jornal i.

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