22 de setembro de 2008

Venenos de Deus, Remédios do Diabo

O médico Sidónio Rosa encolhe-se para vencer a porta, com respeitos de quem estivesse penetrando num ventre. Está visitando a família de Bartolomeu Sozinho, o mecânico reformado de Vila Cacimba. À porta, a esposa, Dona Munda, não desperdiça palavra, nem despende sorriso. É o visitante quem arredonda o momento, inquirindo:
- Então, o nosso Bartolomeu está bom?
- Está bom para seguir deitado, de vela e missal...
A voz rouca parece distante, contrariada como se custasse o assunto. O médico acredita não ter entendido. Ele é português, recém-chegado a África. Refaz a questão:
- Perguntava eu, Dona Munda, sobre o seu marido...
- Está muito mal. O sal já está todo espalhado no sangue.
- Não é sal, são diabetes.
- Ele recusa. Diz que se ele é diabético, eu sou diabólica.
- Continuam brigando?
- Felizmente, sim. Já não temos outra coisa para fazer. Sabe o que penso, Doutor? A zanga é a nossa jura de amor.


Assim começa o mais recente livro de Mia Couto, Venenos de Deus, Remédios
do Diabo, que me foi oferecido por um querido amigo. Dá vontade de
continuar a ler, não dá?

2 comentários:

Leticia Gabian disse...

Vou continuar, sim. Será que encontro por cá?...Não encontrando em salvador, vou procurar na FNAC em São Paulo... Lá acha-se de tudo!

Maria disse...

Até ao fim....
É apenas mais um livro lindo do Mia...

Um beijo