28 de agosto de 2007

Fernando Seara

A minha admiração por Fernando Seara não é recente, e tem aumentado com o passar do tempo. Começou pela sua (nossa) paixão clubística, continuou no seu bom senso político, embora neste caso estejamos em campos opostos, e firmou-se na competência com que tem gerido a Câmara onde voto e resido.

A semana passada apreciei a forma descomplexada como publicamente teceu rasgados elogios ao Ministro da Administração Interna, ao secretário de Estado da Protecção Civil e ao Presidente da Câmara de Lisboa, todos afectos ao Partido Socialista, pelas suas actuações no combate aos fogos que consumiram uma parte do Conselho de Sintra. Nos tempos que correm, é uma atitude que merece registo.

Ontem, ao folhear a Visão deste semana, deparo com uma entrevista de várias páginas, num tom muito pessoal e directo. Deixo-vos aqui algumas passagens:

(…) Mas não tinha qualquer hipótese de ser boémio, a minha mãe ainda hoje é uma grande matriarca e faz comentários sobre a gravata que eu uso na televisão.(…)

A matriarca ainda hoje tem poder nas suas decisões?
Então não tem! Foi ela quem me “proibiu” de concorrer à presidência da Câmara Municipal de Lisboa.

Como assim?
Escreveu-me uma carta em que entendia que eu não deveria abandonar Sintra, porque os mandatos são para cumprir. A decisão foi minha, mas ela foi importante. Recorro muito aos conselhos dela, da minha mulher e do meu filho. Ele e a avó estavam contra eu avançar para Lisboa. Já para a Judite, o que eu decidisse estava bem feito.

(…) Percebi que nos partidos os maiores inimigos estão dentro do próprio partido. Os adversários estão fora, os maiores inimigos estão dentro.

Quem está no poder não permite essa renovação. Há uma série de actores políticos que deixaram de viver no T1 e passaram a habitar o T4. E que, para continuarem a morar no T4, não podem largar a vida política. Os partidos são isto. Para contestar o PS seria necessário um movimento ideológico forte. E o PSD não o tem conseguido fazer. Nas questões centrais como, por exemplo, a privatização da água, qual é a posição partidária? Muita gente será a favor, eu sou contra.

O partido tem muitos desses paradoxos…
Mas esses é que são os elementos de unificação do pensamento do partido. O PSD não vive uma crise de liderança, mas sim de identidade. O problema são as múltiplas lideranças, nalguns casos concorrenciais.

Sente-se politicamente limitado por causa desses estados de coisas?
Não, nada. Nunca pensei ser presidente da Câmara de Sintra e candidatei-me apenas para ajudar um amigo em tempos difíceis do PSD. A minha candidatura foi assinada apenas por António Proa, que era o último suplente da então comissão política distrital de Lisboa…Nunca me esqueço disso!

Isso tem um significado revelador para si?
Ai tem, tem…muitos daqueles que não assinaram foram dos primeiros a pôr-se em bicos de pés no momento em que ganhei. Pensava-se que a minha candidatura era para perder, e por muitos.

Até o senhor achava que ia perder. Era uma opinião genuína ou humildade estratégica?
No momento em que Durão Barroso me convidou, mostrou-me as projecções: Edite Estrela 59%, PSD 19%. «Se tu subires um bocadinho já é um bom resultado», disse-me ele. Só senti as coisas a virarem cinco dias antes das eleições, quando 70% dos automobilistas da rotunda de Massamá abriram o vidro para receber o panfleto que eu andava a distribuir à chuva.

Vai candidatar-se a um terceiro mandato, em 2009?
Não. Sintra tem todas as condições para ser um concelho de desenvolvimento estável e com capacidade para atrair pessoas.

(…) ocupei durante muito tempo cargos na Federação Portuguesa de Futebol (…)
Nunca se apercebeu do tipo de casos recentemente alvo de acusação judicial no processo Apito Dourado?
Então não me apercebi!? Enviámos, aliás, nessa altura, para a Polícia Judiciária, várias questões respeitantes à viciação de arbitragens. Numa delas, as classificações dos juízes eram emendadas a borracha e tinta-da-china. Sou das pessoas que mais sabe sobre o que se passava nesses tempos. O Apito Dourado é a expressão de um futebol português e de uma série de pessoas que julgaram que nunca seriam apanhadas. Apenas e só.

(…) Mas o Benfica diz-me muito: para mim, nunca perde. Ás vezes é que não ganha…

Sente mesmo assim ou é a sua imagem de marca?
Garanto que é verdade. Como também é verdade que houve segundas-feiras em que, já como professor, chegava de muito mau humor à universidade, sobretudo se a derrota tivesse sido contra o Sporting. Mas um dos momentos mais exaltantes da minha vida passei-o em pleno oceano Atlântico. Estava a voar para os Açores e o meu amigo Eusébio começou a contar, como se fosse um relato, todos os momentos do célebre Coreia-Portugal, do Mundial de 1966. Aquilo foi tão empolgante que o comandante avisou que ou nos sentávamos todos ou regressávamos a Lisboa.


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