22 de janeiro de 2010

Ponto de Citação - Corpo e Mente

O que foi o pior que lhe aconteceu?

A coisa mais desagradável foi terem ido para a porta da minha família, procurarem os meus pais e as minhas irmãs, sem um telefonema, sem uma autorização. Há limites que as pessoas não respeitam em prol de uma história e de um bocadinho mais de vendas.

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Grandes actores admitem que as cenas de sexo são difíceis. Diz que para si são só mais uma cena. É mesmo assim?

É. Nunca me senti demasiado exposta. Talvez tenha a ver com o facto de ter trabalhado durante muitos anos em moda. Consigo criar uma distância entre o que é a minha imagem e o que é a minha intimidade. É-me mais fácil expor o corpo do que as minhas emoções.

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O que fazem os seus pais?

Preferia não falar disso. Não tenho o direito de andar a expor a vida dos meus pais só porque o meu trabalho é exposto publicamente. Nem dos meus pais, nem das outras pessoas que me rodeiam.

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Está a estudar representação em Madrid. Porque saiu de Portugal?

Para alargar os horizontes. Temos um mercado muito pequeno. São quatro anos. Só tenho aulas dois dias por semana. Para aproveitar o tempo estou também a fazer um curso de guião, mais por curiosidade, do que por querer escrever.

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Os seus colegas sabem que em Portugal é famosa?

Já descobriram. A internet é de facto...

Como reagiram?

Riem-se. Porque eu não me comporto como uma pessoa conhecida. Sou uma estudante, uma miúda normal. Vou para as minhas aulas, bebo os meus cafés, as minhas tapas, as minhas cañas.

E aproveita a "movida" madrileña?

Aproveito. Discotecas não tanto. Mais essa onda dos bares e da rua. Estar com os amigos a beber uma cerveja, conversar, clubes de jazz, a conversar.

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Qual é o seu papel de sonho?

Não tenho, mas consigo pensar num ou noutro. Por exemplo, o da Gena Rowlands em "A Woman Under the Influence" do John Cassavetes. Se ele estivesse vivo talvez não me atrevesse a dizer isto. Podia ser visto como pretensioso. Admiro as interpretações que o Mike Leigh obtém em filmes como "Segredos e Mentiras".

São papéis muito diferentes do que tem feito até agora.

É, não é? Nos portugueses, admiro o João Canijo.

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Porque é tão reservada em entrevista?

Acho que sou uma péssima entrevistada. Tenho dificuldade em sentir-me à vontade com um estranho, confiar pormenores da minha vida, da minha personalidade, dos meus sonhos ou das minhas ambições com alguém que não conheço. Fico de pé atrás.

Tem medo de alguma coisa?

Sempre fui assim. Gosto que o meu mundo seja meu. E só exponho esse mundo a poucos amigos. Quando comecei a ter esta exposição mediática, incomodou-me muito o interesse pela minha vida. Não tenho necessidade, nem percebo a necessidade de saber da vida pessoal de outras pessoas. Não é medo dessa exposição, é não querer essa exposição.

Às vezes parece querer sublinhar o seu lado intelectual. Acha que as pessoas têm uma ideia errada de si por ter sido modelo e fazer cenas de nudez?

Depende. Já ouvi algumas observações sobre a minha pessoa...

Como por exemplo?

"Só se quer despir", "O que lhe interessa é a exposição mediática e aparecer na capa das revistas", "não tem ambição de ser boa actriz". Acho que isso vem de uma mentalidade pequena, limitada. Até se pode chamar de ignorância.

Os comentários incomodam-na?

Houve uma altura em que sim, em que me senti quase um misantropo. Agora para essas pessoas que acham que gosto de falar de coisas intelectuais falo d'"O Misantropo" do Molière. Não queria estar numa sociedade hipócrita, afastei-me de toda a falsidade que existe no mundo. Criou-se uma personagem que não tem nada a ver comigo e é essa personagem que vive no imaginário das pessoas.

Tem noção de que é uma fantasia para muitos homens e algumas mulheres?

Acho que as coisas já não são bem assim. Isso aconteceu mais na altura de "O Crime do Padre Amaro" e do "Call Girl".

Como é sensação de olharem para si na rua? Sabe que é bonita, sensual...

Nem sempre me sinto bonita. Tenho dias em que me sinto horrível, não me consigo olhar ao espelho. Acho que as pessoas criaram essa ideia não pela minha beleza mas pela personagem que eu interpretei. É isso que mexe com as pessoas.

Excerto da entrevista da actriz Soraia Chaves ao jornal i.

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