28 de dezembro de 2009

Ainda sobre o Natal...

«Sem querer, o Natal encerra em si o paradigma da humanidade: ao pretender respeitar a individualidade, reconhece-se com mais frequência no que é comum a muita gente e aceita apagar-se em nome de uma ideia partilhada por muitos.

(...)

Substituímos as cartas pelos emails, e os emails pelos sms, e agora os sms por bonecos e presentes do Facebook - e nesta sucessão de facilitações aferimos como os tempos e os seus ícones vão tomando conta do evento. Mais do que perder a religiosidade, a quadra tornou-se uma espécie de Cimeira de Copenhaga: tenta-se o mínimo denominador comum - pode ser o bacalhau ou a Missa do Galo, um estandarte ou um Pai Natal a trepar estupidamente por uma varanda... -, para conseguir ultrapassar todas as diferenças, todos os hiatos, todas as faltas. Negoceia-se para chegar ao acordo que é a noite de dia 24, quando a paz é convocada por todos. Por minutos que seja.
Dois dias depois, ou seja, dia 26, a tenda começa a ser desmontada. O divino, o transcendental, os rituais mais ou menos adquiridos para expressar fé e crença, vão dando lugar ao back to reality. Daqui a pouco é ano novo, passas e champanhe. Ary dos Santos tinha razão quando falava do "sabor amargo em cada doce que eu comprei".
Nós religiosos? Com certeza que sim. Mas aí sim, "quando um homem quiser", ou seja, muito de vez em quando.»

Excerto do editorial de Pedro Rolo Duarte, no suplemento Nós Religiosos, do jornal i.

1 comentário:

Maria disse...

Completamente de acordo com o artigo de PRD. Bom saber que a poesia de Ary atravessa horizontalmente a sociedade portuguesa.

:)