23 de novembro de 2009

Ponto de Citação

Há dois tipos de conservadores no mundo: os que sempre foram, e vivem felizes na sua condição, tranquilos nos seus blazers espinhados, nos padrões Burberry e nas camisas de xadrez; e os que demoram anos a reconhecer o seu conservadorismo e o fazem sempre a contragosto, resistindo às evidências. Pertenço, evidentemente, a estes últimos - razão pela qual persisto na ideia de conviver harmoniosamente com a modernidade, embora só me sinta feliz no reduto que já conheço.

(...)

Nos dias que correm, quando alguém olha para o passado e vê os lugares por onde passei - nomeadamente "O Independente", a "Kapa", o "DNA" -, é corrente falar da modernidade associada a estes títulos, da ideia de vanguarda ou inovação. Normalmente não me excedo no contraditório - mas a verdade é só uma: o que une todos estes títulos é uma ideia conservadora. A ideia de que os jornais e as revistas se fazem com pessoas que escrevem, fotografam, investigam, imaginam - e cuja força maior é serem elas próprias. Nenhum destes títulos inventou a roda - todos recuperaram rodas já muito rodadas: a entrevista, a reportagem, a fotorreportagem, a crónica, o humor, a notícia, a investigação, a causa, a crítica. O grafismo de todos eles foi inspirado no melhor que já se tinha feito. A estrutura foi sempre uma síntese do que de bom víamos fazer noutros lugares. E até o sucesso que estes títulos tiveram resultou da fórmula mais antiga de comercializar: se dermos ao consumidor o que ele não tem - e, chave do cofre, se tivermos a oportunidade de lhe provar que lhe faz falta o que nem sempre ele tem consciência da falta que lhe faz -, é muito provável que ele nos compre regularmente.
Tenho dificuldade em dar o braço a torcer. Mas ele já foi tão torcido e retorcido ao longo da vida que já nem sente a dor quando eu digo baixinho, timidamente, "sim, conservador, talvez seja..."

Pedro Rolo Duarte, no suplemento "Nós Conservadores" do jornal i.

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