17 de junho de 2005

Crimes Ambientais

O texto que aqui reproduzo é composto por excertos de uma reportagem incluída na revista "Visão" do passado dia 9 de Junho.
"... Os atentados ambientais não fazem os portugueses perder o sono. Pegando no último inquérito ambiental do Eurobarómetro, deste ano, podemos definir as preocupações lusitanas de uma forma muito simples: «É importantíssimo protegê-lo, desde que não tenha de ser eu a fazê-lo nem me saia do bolso.»
(...)Com uma forma de pensar tão própria, não é de admirar que (...) o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) encontrasse, numa mega-operação realizada no ano passado, 900 oficinas que se desfaziam dos seus óleos usados literalmente pelo esgoto abaixo, num total de 1200 visitas. Ou que o mesmo braço da GNR, numa acção de rotina a caminho de um matadouro da região de Lisboa, multasse 49 dos 50 camiões de transporte de gado controlados, por infracções relacionadas com as más condições reservadas aos animais.
Esta mentalidade refecte-se nas atitudes dos governos, acredita José Alho, presidente da Liga para a Protecção da Natureza.
(...) O ambientalista refere-se ao estado a que chegou o Instituto de Conservação da Natureza (ICN): no ano passado, teveos seus telefones cortados devido a uma dívida de um milhão de euros à PT, parou de enviar cartas por não haver dinheiro para os selos e os carros de serviço não saíam por falta de combustível. As autoridades não se deixaram comover - para 2005, o orçamento deste instituto que regula os parques naturais foi reduzido em 30 por cento.
(...)
Actualmente a directoria da Polícia Judiciária (PJ) está a investigar apenas dois processos, ambos devido à poluição de rios, porque a lei exige demasiado. Primeiro, a fábrica que estiver a enviar químicos para as águas terá de ser avisada pelos técnicos da entidade reguladora (a ICA, por exemplo, que conta com 30 técnicos para todo o País). Só então, se a situação se mantiver e houver hipóteses de se provar perigo para a saúde pública, a PJ pode entrar na jogada.
(...)
Em 2003, vários fogos criminosos queimaram o concelho de Vila de Rei. Passados dois anos, aínda não existe qualquer plano de reflorestação em marcha.
(...) Nesse ano, as chamas queimaram 90% da área florestal e destruíram oito habitações. Para o comandante daquela corporação não há dúvidas. «Isto foi mão criminosa. Encontrámos vários dispositivos incendiários colocados em pontos estratégicos», revela Luís Santos. (...) Dois anos volvidos e ninguém provou ter havido interesses comerciais por detrás dos fogos, aquela foi a Câmara que menos dinheiro recebeu no distrito e as árvores continuam pretas. (...) Único ponto positivo, para alguns, claro: o preço de uma tonelada de madeira de pinheiro desceu de 44 para 12 euros. As perdas para o ecossistema, essas, não têm preço.
(...)
O litoral alentejano ainda é uma das poucas costas portuguesas que passaram relativamente incólumes à feroz apetência imobiliária que desbravou a maior parte do litoral português. Mas parece ter chegado a sua hora. Se todas as urbanizações projectadas e planeadas para a linha entre Tróia e a Zambujeira do Mar forem aprovadas, serão ali criados empreendimentos turísticos e de segunda habitação para 70 mil novas camas. Dessas, quase 30 mil estão planeadas para áreas protegidas pela Rede Natura 2000.
(...) A grande asneira algarvia não parece ter servido de lição - empresários e presidentes de câmara continuam a privilegiar o betão e a encarar a defesa do ambiente como uma barreira ao desenvolvimento. E as pressões sucedem-se. O presidente do município de Grândola, por exemplo, mostrou-se furioso com o parecer negativo dos técnicos do ICN a dois empreendimentos projectados para o conselho com capacidade para seis mil pessoas, dentro da Rede Natura 2000. Em declarações à agência Lusa, Carlos Beato chegou mesmo a sugerir que «é preciso ter coragem política para os pôr [aos técnicos do ICN] no seu devido lugar.»"
Não me parece que sejam precisos mais comentários.
Rogério Charraz

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